5º Aniversário do Grupo de Ação Pastoral da Diversidade


Hoje, no dia de Todos os Santos e Santas, comemoramos o 5º aniversário da nossa Comunidade de Fé, o Grupo de Ação Pastoral da Diversidade! Tudo começou em 2011 com o Padre James Alison, um sacerdote inglês que vivia no Brasil e, deixando de lado as convenções sociais, começou um trabalho de acolhimento pastoral junto a comunidade LGBT seguindo a orientação de Jesus sobre os famintos: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Lc 9,13).


A formação do nosso grupo ocorreu então com a celebração de uma missa em 1º de novembro de 2011, e hoje o trabalho continua sendo feito por nós – leigos e leigas – que assumindo nossa vocação batismal, tão revalorizada pelo Vaticano II, participamos alegremente do anúncio da Boa Nova do Senhor por toda a terra e à todas as pessoas.

Como bem sabemos, onde 2 ou 3 estiverem reunidos em nome de Jesus, Ele também estará presente (Mt 18,20), e é por isso que nossa celebração de aniversário é também uma celebração da Palavra, desse testemunho histórico do Senhor que não se envergonhou em dar a vida por nós. Essa palavra de vida nos fala hoje da realização final da humanidade, a Comunhão dos Santos, e a escolha dessa festa para começar nosso trabalho enquanto comunidade não foi um mero acaso de agenda. Essa festa traz uma grande provocação que é unir a vocação à santidade – que é a vocação de todos – com a vocação à alegria. Os santos e as santas são os impacientes da alegria, são os que são felizes ajudando os outros a serem felizes. Por isso são os bem aventurados, que podem ser compreendidos como “abençoados”, “felizes” ou “alegres”. Também não por acaso “alegre” é justamente uma das traduções da palavra “gay”.

Isso não é uma forma de ler o Evangelho em um contexto pró gay! Ao contrario, esse é o jeito de contar a nossa história de uma forma honesta e sem lentes ideológicas. Afinal, muitos de nós somos gays e somos também cristãos, isso é um fato! E enquanto batizados, nós fomos chamados por Deus pra participar dessa família. É a voz do Deus Vivo que nos convida e nos insere na Comunhão dos Santos, do Deus que, assim como reconheceu São Pedro depois de um jantar na casa de Cornélio (At 10,34), não faz acepção de pessoas! Da alegria trazida pelo Senhor ninguém é excluído. “Exultai de alegria porque, o Senhor consola seu povo e se compadece do desamparado” (Is 49,13), disse o profeta Isaías. “Alegra-te!” (Lc 1,26), disse o anjo à Maria. O próprio Jesus diz no sermão da montanha: “Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus.” (Mt 1,12).

 O cristão, como bem lembrou o Papa Francisco em sua Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, não pode ter cara de uma Quaresma sem Páscoa, porque a presença de Deus é luz e alegria. Esse deve ser o nosso dom enquanto comunidade LGBT para a Igreja, o dom da nossa alegria enriquece a Comunhão dos Santos, porque a nossa alegria sobrevive aos preconceitos, às violências, às rejeições.

Mas podemos nós, as pessoas LGBT, participar da Comunhão dos Santos? A resposta é “Sim”! Quando os primeiros escritos cristãos falavam de "santos" estavam designando os membros da comunidade que tinham sido batizados em nome do Cristo: os que tinham sido "santificados". Mas não só! É por isso o Apocalipse nos lembra das 12 tribos de Israel, os santos do Antigo Testamento, os 12 Apóstolos, os santos do Novo Testamento, e nos revela a imensa multidão dos que foram marcados com o selo, tão numerosa “que ninguém podia contar” (Ap 7,9), todos de diferentes etnias, nações, tribos, e por que não diferentes orientações sexuais?

Mas apesar da grandiosidade dessa revelação, não é a essa multidão celeste que devemos nos apegar, pois eles são o povo do mundo que está por vir e o Reino de Deus vem a nós, já está aqui. Fazemos parte dele! As bem aventuranças não são portas fechadas de um caminho já percorrido, são processos contínuos: Não são os que tiveram fome, mas os que têm. Não os que foram perseguidos, mas os que são. Outra forma de tradução possível para a palavra em aramaico “bem aventurado” é “em marcha”, ou caminhando. Em marcha os pobres em espírito, em marcha os que têm fome e sede de justiça... É o que diz São João (Jo 3,2), quando articula o presente (desde agora somos filhos de Deus) com o futuro (o que seremos não apareceu ainda), e é por isso que nós já participamos da "Comunhão dos Santos" e podemos e devemos contribuir com nossos dons para com ela.

A melhor forma de viver essa Comunhão é compreendermos que somos feitos a imagem e semelhança de Deus (Gn 1,27), mas ainda somos incapazes de vê-lo como Ele e é. Por isso pintamos Deus como um avarento dos seus dons, como um juiz moralista ou um mestre intransigente, porque essa é a nossa própria imagem e não a de Deus, essa é a imagem apresentada pela serpente no Éden (Gn 3).  E é para romper essa cortina de fumaça que somos chamados, precisamos buscar a verdadeira face de Deus para que “venha a nós o vosso reino”. Quando nós compreendemos essa verdade, compreendemos também que a santidade não é a princípio nenhuma perfeição moral, até porque ela não pode ser conquistada por esforço próprio. É o dom de Deus que nos santifica. Não nos fazemos santos, somos "santificados" ou, como diz Paulo, "justificados", para além das nossas falhas.

Nesse quinto aniversário do nosso grupo, esse é o convite que fazemos ao nosso grupo e a todos os cristãos, católicos ou não, LGBT ou não, que deixemos para trás o homem velho e essa concepção de Igreja fechada, saudosista, moralista, contida. Somos chamados a viver uma nova Igreja, que é aberta, dialogante, jovem, vibrante, que se arrisca sem medo de machucar-se, que sai às ruas, que é hospital dos feridos e que respeita os diferentes. Essa Igreja não é um prédio ou uma denominação. Essa Igreja somos nós, o Povo Santo de Deus.

Não fiquemos esperando a margem do caminho. As mudanças na Igreja não vêm exclusivamente de cima, vêm também do seu povo, da sua base, porque é por aqui que passeia o Espírito Santo. A nós Leigos, Pobres, Mulheres, Gays, Lésbicas, Transexuais, Excluídos, cabe à tarefa de renovar o mundo, de se abrir para a santificação pelo espírito, partindo sempre da fé Boa Nova de Jesus que é Salvação. "Quem poderá, então, salvar-se?" perguntaram a Jesus, e ele respondeu: "Ao homem isso é impossível, mas a Deus tudo é possível.” (Mt 19,25-26).

Possamos compreender que a pertença ou não a Comunhão dos Santos não se justifica pela adesão a verdades ortodoxas da fé, mas à prática ou não do Amor. Um dia, vamos conhecer os verdadeiros santos de todas as religiões e de todos os ateísmos: são eles os que viveram amando, no anonimato, sem nada esperar. Nisso cremos e por isso esperamos!


São Paulo, festa de Todos os Santos e Santas no ano da graça de 2015.

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