Aos homossexuais que ficaram decepcionados com as conclusões do Sínodo

Caros bispos, estamos convencidos de que, ao reiterar certas coisas, a principal preocupação de vocês é a de não trair o Evangelho. Mas a nossa vida, a nossa experiência de oração, a bondade das relações que construímos nos sugerem uma leitura do Evangelho em que o nosso progressivo caminho de aproximação à perfeição cristã passa por aquilo que há de bom na nossa homossexualidade

A opinião é de Gianni Geraci, leigo católico gay italiano, presidente do Il Guado de Milão, um grupo de reflexão sobre fé e homossexualidade. O artigo foi publicado no sítio do projeto Gionata, 26-10-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto para o IHU.

Eis o texto.

Sobre o tema da homossexualidade, eu não esperava muito de um Sínodo sobre a família composto por bispos que, em imensa maioria, não consideram as uniões entre pessoas do mesmo sexo como família.

Prova de que essa era a orientação da maioria dos Padres sinodais é a segunda parte do ponto 76, quando, citando as Considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais, afirma-se que: "Acerca dos projetos de equiparação ao matrimônio das uniões entre pessoas homossexuais, 'não existe fundamento algum para assimilar ou estabelecer analogias, nem sequer remotas, entre as uniões homossexuais e o desígnio de Deus sobre o matrimônio e a família'".

Trata-se de uma afirmação compartilhada pela imensa maioria dos Padres sinodais e votada por unanimidade pelos dez membros do grupo de trabalho que tinha recebido o encargo de preparar o texto da Relatio synodi a ser submetida à assembleia também por aqueles que são indicados como "bispos progressistas".

Mas justamente o status de família dos casais compostos por pessoas do mesmo sexo é o nó que uma reflexão séria sobre a homossexualidade deveria desfazer à luz não só dos tons polêmicos que caracterizaram as posições do Magistério nos últimos anos, mas também da práxis e da reflexão que atravessou a Igreja durante a sua história, uma práxis e uma reflexão que propuseram uma ideia de família muito mais extensa do que aquela um pouco asfixiada daqueles que defendem que a única família é a fundada sobre o matrimônio entre um homem e uma mulher.

Quem fim têm, à luz de uma visão tão restrita, as tantas "famílias" religiosas que enriqueceram a história da Igreja? Que fim têm as "mães por vocação" que aceitaram criar, sozinhas, os filhos dos quais não eram mães naturais? Quem fim têm os tantos modelos de intimidade familiar que, ao longo dos séculos, geraram aquelas paternidades, aquelas maternidades, aquelas fraternidades espirituais que nasciam da preocupação de viver plenamente as palavras de Jesus quando, no capítulo terceiro de Marcos, se pergunta: "Quem é a minha mãe? Quem são os meus irmãos?".

Sobre esse assunto, em todos os casos, eu não esperava muito e, por esse motivo, não ficou decepcionado com aquilo que o Sínodo escreveu sobre a homossexualidade. Eu diria até que me parece algo muito positivo a atenção que o Sínodo reserva às famílias "que vivem a experiência de ter em seu interior pessoas com tendência homossexual".

Parece-me positivo, porque o Sínodo lembra a essas famílias que "toda pessoa, independentemente da sua orientação sexual, deve ser respeitada na sua dignidade e acolhida com respeito, com o cuidado para evitar 'toda mancha de injusta discriminação'" e, ao fazer isso, retoma as aberturas da carta "Sempre nossos filhos", talvez o documento, dentre os produzidos pelo magistério da Igreja sobre a homossexualidade, que é menos condicionado pelo medo que, ao contrário, sufoca outros textos dedicados ao mesmo assunto.

Em vez disso, preocupa-me a referência feita no parágrafo 8 àquela fantasmagórica "ideologia do gender", que existe apenas na fantasia de quem tem uma ideia aproximada do mundo variado dos gender studies. Preocupa-me porque é mais um sintoma do fato de que, com cinco séculos de atraso, está surgindo um novo "caso Galileu", em que a cúpula da Igreja, enganada por falsos especialistas que confundem a apologética com a pesquisa científica, parecem não ser mais capazes de ler corretamente alguns aspectos importantes da reflexão antropológica contemporânea.

À luz dessa situação, em que as luzes e as sombras não permitem identificar, no Magistério da Igreja que se expressa na Relatio final do Sínodo, aqueles claros sinais de abertura que muitos desejavam, eu gostaria de convidar a todos os homossexuais católicos e a todos os católicos que trazem no coração o tema da valorização e da inclusão das pessoas homossexuais na Igreja que não percam a esperança.

A falta de reconhecimento do valor da nossa experiência específica de crentes que procuram viver o Evangelho sem negar a sua homossexualidade não deve nos abater, mas, ao contrário, deve nos levar a viver com maior coerência e seriedade a nossa vida e as relações que a Providência nos permitirá construir.

Mais uma vez, somos chamados a não buscar autorizações externas que, por tantos motivos, parecem nunca chegar, mas a seguir a nossa consciência, que, como escreve Tomás de Aquino no De Veritate, "vox Dei est".

Naturalmente, para não correr o risco da autorreferencialidade, devemos levar a sério a tarefa de formar a nossa consciência, escutando com atenção as indicações teóricas que nos vêm do Magistério e confrontando-as, talvez apoiando-nos no conselho de algum irmão na fé, com as situações específicas que somos chamados a enfrentar.

Será a conclusão desse processo de discernimento, e não as palavras distantes de uma assembleia que não conhece concretamente a nossa vida, que vai nos dizer o que devemos e o que não devemos fazer.

Mas, justamente porque muitas vezes acontecerá de observarmos diferenças entre as conclusões às que, em consciência, chegaremos e as indicações dadas pelo Magistério, também temos a tarefa muito importante de abandonar qualquer forma de hipocrisia e de viver à luz do sol a nossa vida, as nossas escolhas e as eventuais relações que nascerem dessas escolhas.

E, se não forem os conselhos pouco sábios de especialistas que não são realmente "especialistas", serão as nossas vidas que finalmente vão ajudar a Igreja a mudar de atitude em relação à homossexualidade. Porque podemos dizer serena e tranquilamente: "Caros bispos, estamos convencidos de que, ao reiterar certas coisas, a principal preocupação de vocês é a de não trair o Evangelho. Mas a nossa vida, a nossa experiência de oração, a bondade das relações que construímos nos sugerem uma leitura do Evangelho em que o nosso progressivo caminho de aproximação à perfeição cristã passa por aquilo que há de bom na nossa homossexualidade".

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