Meditação para o 1º Domingo da Quaresma de 2015

Meus amados e amadas, vocês me dão muita alegria:


"Tu és meu Filho Bem Amado; me dás muita alegria." Mc 1,9-15
"... nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio." Gn 9,8-17


O carnaval terminou há uma semana em países de maioria cristã mundo afora. O carnaval é um tempo de extravagância antes do austero período da Quaresma. Durante o carnaval cores, comida farta e dança acontecem ao ar livre em muitas cidades. Este ano, o famoso carnaval do Rio de Janeiro foi eclipsado pelo assassinato de Cláudia da Silva, 25 anos, uma mulher transexual conhecida como Piu. Ela era da Beija-Flor. No Brasil, uma lésbica, um gay, uma pessoa trans ou bissexual é assassinada a cada 28 horas. A tortura e assassinato de Piu foi postada nas redes sociais. A morte aconteceu numa favela próxima, o Morro da Mina, controlado por traficantes. As fantasias, o colorido e os ritmos dançantes não podem esconder a realidade nua e crua da pobreza, das drogas e da violência no Rio de Janeiro.

Estamos vivendo num mundo complicado no qual a violência, a desigualdade, o preconceito e o ódio estão em escandalosa ascensão. Questionando a realidade, nos perguntamos: onde está a esperança?
O evangelho de Marcos foi escrito numa época de convulsão política e instabilidade social. A destruição do templo em Jerusalém e a derrota dos movimentos de libertação de Israel pelo poderio militar romano criou uma enorme crise e obrigou as pessoas a se perguntarem onde estava a esperança. Jesus viveu em meio à agitação social que deu origem a diversos movimentos messiânicos que pretendiam responder à falta de esperança daqueles tempos. O tom apocalíptico de Marcos é um lembrete de que a desesperança terá fim: "Completou-se o tempo e reino de Deus está próximo." Mas onde está este reino? Jesus sabia que esta era uma pergunta difícil e, talvez, por este motivo, e antes de iniciar seu ministério, ele confrontou o mal dentro de si mesmo na solidão do deserto. A missão de Jesus era ajudar as pessoas a descobrirem a face de Deus em meio à pobreza e à violência, desmascarando as respostas fáceis do poder religioso e político.


Na narrativa do Gênesis, descobrimos uma história em que Deus assume o seguinte compromisso: "... e nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio." Não se trata de uma promessa de que coisas ruins não acontecerão ao nosso planeta. Talvez seja uma promessa divina destinada a controlar as respostas fáceis que seriam onipotentes e, ao invés disso, proclamar a todos nós: vocês são minhas filhas e filhos bem amados; vocês me dão muita alegria.

De certo modo, durante a Quaresma, o mundo cristão, dos grupos mais fundamentalistas ao Vaticano, gera discursos de Deus que mascaram o reino... um reino que está no meio de nossas mais profundas contradições, que é frágil como uma criança, uma pessoa trans ou uma mulher estuprada. Deus nos chama hoje: "vocês são minhas filhas e filhos bem amados; vocês me dão muita alegria." Devemos ir para o deserto para confrontar o mal que existe dentro de nós e então retornar para encontrar a face de Deus no meio dos conflitos e das contradições "... e nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio."

Autora: Reverenda Margarita Sánchez De León, da ICM
Tradução: Lula Ramires

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